Réu teria se negado a reconhecer a paternidade de filha que teve com sua ex-companheira, passando a perseguir e ameaçar a mulher após ela iniciar uma nova relação. Juíza responsável pelo caso considerou necessária a aplicação do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ
Em mais uma decisão do Poder Judiciário do Acre (PJAC) emanada a partir da ótica do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a juíza Evelin Bueno, respondendo pelo 3º (JEC) Juizado Especial Cível da Comarca de Rio Branco, condenou um homem ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes de episódios de violência doméstica e familiar.
De acordo com a decisão, o reclamado teria se recusado a registrar a filha que teve com a vítima, submetendo a reclamante a constantes agressões verbais durante o período gestacional, perseguindo-a e a abordando em locais públicos, bem como em sua própria casa, em diferentes ocasiões, tecendo ameaças para, em um ato de aparente arrependimento, forçar a reclamante a entregar a documentação da garota para que pudesse pedir a inclusão tardia de seu nome no registro de nascimento.
Entenda o caso
Segundo os autos, o reclamado teria ainda enviado várias mensagens de cunho ofensivo por meio de rede social, xingando a vítima com termos do mais baixo calão, afirmando que, caso comprovasse que a filha era realmente sua, lhe “tiraria tudo”, o que declarou que também faria se a garota não o fosse. Os episódios representaram grande abalo para a mulher, que, para se precaver, bloqueou o reclamado em todas as redes sociais e mudou-se de endereço por medo, destacando que, como mulher, sentia-se “vulnerável diante da agressividade” do homem.
Ainda conforme os autos, o reclamado ajuizou ação de investigação de paternidade, por meio da Defensoria Pública do Estado do Acre (DPE/AC), porém, não compareceu à audiência, tendo sido declarado revel (desistente) no processo.
Sentença
Ao apreciar o caso, a juíza de Direito Evelin Bueno considerou que as circunstâncias dos atos delitivos implicam na aplicação do Protocolo de Julgamento de Gênero, instrumento normativo orientador que busca combater desigualdades estruturais e reconhecer as diversas formas de violência que atingem as mulheres, “especialmente, no âmbito das relações domésticas e familiares”.
A magistrada registrou na sentença que o relato da vítima encontra respaldo nas provas documentais e testemunhais juntadas aos autos, refletindo um padrão típico de violência psicológica e moral comumente negligenciado por estruturas formais de poder, inclusive por agentes de segurança pública, sendo que a conduta do réu reflete mecanismos de controle e intimidação que caracterizam o ciclo da violência de gênero, conforme descrito na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06), com consequências emocionais e sociais para as vítimas.
“É dever do Poder Judiciário reconhecer que, em contexto de violência de gênero, a palavra da vítima tem especial relevância probatória, sobretudo diante da invisibilidade social e institucional que usualmente recobre esses casos. O comportamento do réu, duvidando da paternidade, negando o registro da criança, perseguindo a autora após o término da relação e utilizando a via judicial de maneira abusiva, constitui violência patrimonial, psicológica e institucional”, anotou a juíza de Direito Evelin Bueno.
Dessa forma, diante da gravidade das condutas, da persistência da intimidação, mesmo após o fim do relacionamento, da vulnerabilidade emocional e material da autora, a magistrada condenou o réu ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 5 mil. Ainda cabe recurso contra a sentença junto às Turmas Recursais do Sistema de Juizados Especiais do Estado do Acre.
Para saber mais sobre o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, clique aqui (link seguro).