5ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco condena servidor público por litigância de má-fé

Sentença considera que devido à deliberada conduta maliciosa e desleal, o autor da ação deve arcar com a multa de 1% sobre o valor da causa.

O Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco, em sentença exarada nos autos do processo nº 0710203-22.2013.8.01.0001, julgou improcedente o pedido do servidor público J. C. N. da C, em ação de indenização por danos morais e materiais, no valor de R$ 1,5 milhão, contra o Banco do Brasil S/A, e o declarou litigante de má-fé, condenando-o a pagar multa de 1% sobre o valor da causa, “nos termos do art. 18 do Código de Processo Civil”. A decisão está publicada na edição do Diário da Justiça Eletrônico desta terça-feira (22).

A decisão é pedagógica, na medida em que orienta os cidadãos a não banalizarem a Justiça, alterando a verdade dos fatos, e usando o processo para conseguir objetivo ilegal, em benefício próprio – especialmente quando o autor da ação, sendo servidor público, deveria dar o exemplo em sentido contrário a essa prática.

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Ao analisar o caso, em que J. C. N. da C alega que foram realizadas diversas transações em sua conta corrente, sem o seu consentimento e que sempre soube preservar o sigilo de sua senha, devendo o banco ser responsabilizado por tais transações, a juíza de Direito Olívia Ribeiro, titular da 5ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco, entendeu de forma adversa. “Não é o que se vê dos autos”, frisou a magistrada sentenciante.

Em sua decisão, a juíza anota que, invertido o ônus da prova, o banco (réu) demonstrou, “através da documentação colacionada aos autos, que as movimentações realizadas na conta do autor pela funcionária do banco, o foram não em razão dessa condição, ou seja, do exercício das funções de funcionária, mas em consequência do relacionamento mantido pelos dois, e em decorrência de terem uma filha em comum, em função de quem as transações eram realizadas, sendo certo que em nenhum momento a sra. M. C. L. O. praticou alguma operação utilizando-se da senha da administração do Banco, mas da senha pessoal do autor, por ele fornecida”.

“Resta comprovada a relação financeira existente entre o casal. Portanto, não merece prosperar a alegação do Autor de que vem sofrendo prejuízos decorrentes de atos de terceiros. Além disso, verifica-se das movimentações efetivadas que, da mesma forma em que foram debitados valores em sua conta, também foram creditados”, destacou a magistrada.

Quanto ao empréstimo na modalidade CDC, que o autor alega não ter realizado, requerendo, inclusive, o imediato cancelamento do mesmo, segundo a juíza, “tem-se a considerar que: 1. foi liberada na conta do autor a importância de R$ 4 mil; 2. não há nos autos notícia de que o autor fez o estorno desse valor ao banco; 3. se o autor não fez referido empréstimo, como explica o fato de que o empréstimo começou a ser descontado em fevereiro de 2012 e somente em agosto de 2013, ou seja, mais de um ano depois, resolveu ingressar com a presente ação? 4. se o empréstimo não foi realizado por ele, como pode, por mais de um ano, silenciar e arcar com as custas do mesmo?”.

Na decisão, a juíza sentenciante enfatiza que, “ainda que paire dúvidas sobre as questões acima, as mesmas são dirimidas pelo depoimento da testemunha do juízo, sra. M. C. L. O , quando afirma que foi ela mesma quem realizou todas as transações mencionadas pelo Autor e que, para tanto, se utilizou da senha pessoal do mesmo, fornecida por ele próprio. Referida testemunha afirma, ainda, que as transações bancárias entre os dois eram em decorrência das despesas da filha em comum (depoimento gravado no SAJ)”.

Por tudo isso, a juíza Olívia Ribeiro entendeu ter ficado patente que todas as transações realizadas na conta de J. C. N. da C (autor) foram feitas pela Sra. M. C. L. O, com a anuência daquele, “aplicando-se, ao caso em exame, a excludente de responsabilidade civil objetiva, por culpa exclusiva do consumidor, prevista no § 3°, inciso II, do mencionado art. 14, da legislação consumerista, na medida em que, ao passar a sua senha, de uso pessoal e intransferível, para a Sra. Michele que, a época, era a sua companheira, o autor assumiu o risco de todas as transações realizadas por aquela e, os prejuízos daí decorrentes, são de sua inteira responsabilidade, havendo, assim, o chamado rompimento do nexo de causalidade”.

Com isso, a magistrada sentenciante decidiu que, afastada a responsabilidade objetiva do banco réu, em razão do rompimento do nexo de causalidade, na medida em que o autor não agiu com as cautelas necessárias, fornecendo sua senha de uso pessoal e intransferível a terceiro, “não há como imputar ao Banco a responsabilidade pelos prejuízos que o autor alega ter sofrido. Da mesma forma, e pelos mesmos fundamentos, está ausente o dano moral, considerando que eventuais dissabores decorrentes dos fatos aqui analisados foram por culpa exclusiva do autor”.

Litigância de má-fé

Quanto à litigância de má-fé, a juíza sentenciante explica que, “tem-se como pressuposto para o seu reconhecimento, a observância de três requisitos, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, sendo eles: que a conduta da parte esteja prevista no rol taxativo do art. 17 do CPC; que à parte tenha sido dada oportunidade de defesa; e que da sua conduta resulte prejuízo processual a parte adversa”.

Nesse sentido, a juíza Olívia Ribeiro verificou que a conduta de J. C. N. da C., ao omitir fatos relevantes na inicial, silenciando que a funcionaria do Banco era sua ex-companheira, com quem, inclusive, tem uma filha, e a quem fornecia sua senha para fazer operações em sua conta, “se amolda perfeitamente à conduta descrita no inciso II do mencionado artigo, posto que alterou a verdade dos fatos, deixando de narrar fatos que fariam diferença no julgamento do processo. Aliás, sabedor de todas as transações realizadas em sua conta, através da genitora de sua filha, com a sua autorização, não era, sequer, para ter movimento a máquina judiciária”.

Ainda analisando o art. 17 do CPC, a magistrada observou que a conduta de J. C. N. da C. “também se amolda ao disposto no inciso III, “usar do processo para conseguir objetivo ilegal”. Segundo a melhor doutrina, o pedido ilegal não seria no sentido de contrário a lei, mas, sim, concernente à intenção de prejudicar aquele contra quem litiga, causando-lhe prejuízos através do processo, como a diminuição da sua credibilidade financeira, o abalo à imagem, desonra, etc. Nesse ponto, é despiciendo dizer que a pessoa jurídica é detentora de todos os caracteres necessário à configuração do dano moral”.

Caracterizada a litigância de má-fé do de J. C. N. da C., “ante a sua deliberada conduta maliciosa e desleal, deve o mesmo arcar com a multa de que trata o art. 18 do CPC, a qual deverá ser revertida em favor do Demandado”, decidiu a juíza.

Por fim, considerando o valor exorbitante dado a causa (R$ 1,5 milhão), em que pese não tenha havido a impugnação, mas considerando que, no âmbito do judiciário acreano, jamais se fixou dano moral nesse patamar, e considerando, ainda, os parâmetros de fixação de dano moral utilizados pelo STJ, a magistrada fixou o valor da causa em R$ 100 mil, sobre o qual deverá incidir a multa acima arbitrada.

Entenda o caso

Ao procurar a Justiça, o servidor público J. C. N. da C alegou que, no período de fevereiro de 2011 a setembro de 2012, foram realizadas diversas transações bancárias em sua conta corrente, sem sua autorização. Em seu pedido, aduziu que, ciente de que não efetivara as transações, e com o fim de verificar a legalidade das mesmas, solicitou do banco demandado, por duas vezes, extratos bancários e cópias dos comprovantes de saque, transferências, cheques avulsos e outros, relativos ao período das supostas fraudes. “Porém, como não obteve resposta, conseguiu alguns extratos on-line, através dos quais constatou algumas movimentações efetuadas pela pessoa de M. C. L. O., funcionária do banco demandado”.

Ressaltou, ainda, que nunca requereu 2ª via do seu cartão magnético, muito menos o perdeu ou extraviou, e que não requereu o empréstimo “crédito automático CDC” realizado em 09/12/2011, e que foram depositados valores em sua conta que não sabe de onde proveio.

C. N. da C alegou que a situação acima narrada vem causando-lhe prejuízos financeiros, tendo que suporta-los em face das movimentações ilegais de sua conta.

Ao final, o servidor público postula, liminarmente, a concessão de antecipação dos efeitos da tutela para determinar ao Banco réu que se abstenha de cobrar as parcelas restantes do empréstimo consignado, com desconto em folha de pagamento, bem como determinar o imediato cancelamento do aludido contrato, sob pena de multa diária.

No mérito, J. C. N. da C postulou “a condenação do banco demandado a pagar, a título de danos morais, R$1,5 milhão e, a título de danos materiais, os valores subtraídos de sua conta corrente, com devolução, em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC”.

Assessoria | Comunicação TJAC

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