Justiça Acreana condena Rede Globo ao pagamento de indenização por danos morais

Em uma decisão inovadora no universo jurídico, a 1ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco julgou procedente o pedido formulado por Gilson Pescador e condenou a empresa Globo Comunicação e Participações S/A (Rede Globo de Televisão) ao pagamento de indenização por danos morais – em decorrência de ofensa ao direito de personalidade do autor, na trama da minissérie “Amazônia – de Galvez a Chico Mendes”.

De acordo com a decisão assinada pelo juiz Laudivon Nogueira, titular da unidade judiciária, a emissora deverá pagar ao autor a quantia de R$ 80 mil.

Ainda de acordo com a sentença publicada no Diário da Justiça eletrônico nº 5.084 (fl. 11), outros pedidos de Gilson foram negados, como a realização de alterações no DVD da minissérie, colocado à venda pela Rede Globo, para fazer constar seu nome correto.

A inovação resulta do fato de que em processos dessa natureza se questiona na Justiça o uso indevido de imagem. Mas neste caso em vez disso foi levado em consideração o dano ao patrimônio moral do autor da ação. Em outras palavras, mesmo não sendo utilizada na minissérie a sua imagem, houve apropriação de sua história (identidade).

Entenda o caso

Gilson Pescador protagonizou ao lado de Chico Mendes a luta agrária e em defesa dos direitos dos seringueiros e pequenos agricultores durante a década de 1980. Inicialmente, como padre e posteriormente, após deixar a Igreja, como membro de uma organização não governamental de apoio à luta pela conservação do meio ambiente.

Ao assistir à “Amazônia – de Galvez a Chico Mendes”, reconheceu-se retratado como o personagem “padre Cláudio”, que desempenha papel semelhante ao seu, inclusive, em momentos decisivos da trama, como na decisão pública de desistir do sacerdócio ao saber que seria transferido de volta para Santa Catarina, sua terra natal.

O autor também se viu retratado em outras cenas, como a da morte do líder sindical Ivair Higino e do histórico “empate” realizado no Seringal Cachoeira em abril de 1988.

De acordo com o autor, desde que sua trajetória pessoal ao lado de Chico Mendes foi retratada de maneira indevida, com a troca de seu nome, ele passou a ser alvo de constantes questionamentos sobre a veracidade de fatos importantes e marcantes de sua trajetória pessoal, que foi ferida e abalada pela Rede Globo.

Por esses motivos, o autor buscou a tutela de seus direitos junto à 1ª Vara Cível da Comarca de Rio Branco, onde ajuizou a ação cível nº 0012519-59.2007.8.01.0001, requerendo a condenação da Rede Globo de Televisão ao pagamento de indenização por danos morais, em razão da violação do direito da personalidade – além da realização de correções no DVD da minissérie, colocado à venda pela empresa, para fazer constar seu nome correto.

Sentença

Ao analisar o pedido formulado pelo autor, o juiz titular da 1ª Vara Cível da Capital destacou que apesar da argumentação utilizada pela Rede Globo – de que o personagem ‘padre Cláudio’ não foi construído baseado na trajetória pessoal do autor, mas sim, criado tão somente para ilustrar o envolvimento da Igreja Católica na luta em defesa dos seringueiros -, “a semelhança não se trata de mera coincidência”.

Para o magistrado, todas as evidências permitem ligar o personagem fictício ‘padre Cláudio’ ao personagem histórico ‘padre Gilson’. “Ao comparar as cenas da obra audiovisual com a história de vida do autor, dúvida alguma remanesce de que, no enredo da minissérie, ‘padre Cláudio é mesmo o autor Gilson Pescador”, ressaltou o juiz.

Laudivon Nogueira também assinalou que a alteração do nome do autor foi inclusive notada – e noticiada – pelos jornais locais, que à época destacaram a ausência da menção ao nome do autor.

Segundo o juiz, ao compor o enredo da minissérie com a participação de ‘padre Cláudio’ reproduzindo fielmente a história de vida do autor, “a ré fez muito mais do que mera ficção; em verdade, ingressou na esfera jurídica do autor, negando-lhe a existência e a identidade com a história”, ferindo, assim, seus direitos fundamentais à personalidade e à dignidade humana, “o que revela a ofensa moral”.

“A atribuição da história do autor a outra pessoa é fato com forte potencial danoso no âmbito interno (psíquico) e no âmbito externo (social). No âmbito interno é indubitável a inquietude, a sensação de ofensa, de humilhação sofrida pelo autor ao acompanhar, impotente, a veiculação da obra audiovisual que atribui a terceiro realizações e falas suas, expressões e decisões tomadas em sua vida”, destacou o magistrado em sua sentença.

Por fim, o juiz Laudivon Nogueira julgou procedente o pedido formulado pelo autor e condenou a Rede Globo de Televisão ao pagamento de indenização a título de reparação pelos danos morais decorrentes da violação do direito da personalidade do autor.

Ao mesmo tempo, o magistrado julgou improcedente o pedido formulado por Gilson para que sejam realizadas correções no DVD da minissérie, colocado à venda pela Rede Globo, uma vez que a medida não teria a eficácia desejada e seria excessivamente restritiva ao direito de liberdade de expressão da ré.

Tanto o autor quanto a empresa ainda podem recorrer da sentença.

Assessoria | Comunicação TJAC

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